quinta-feira, julho 19, 2007

um pouco mais de realismo

O caro TAM fez uma série de afirmações e acusações que, embrenhadas na sua rica prosa, quase passam por recados. Então vamos lá ver, ponto por ponto e de uma forma sistemática:
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1. O império. Vamos tornar claro o tipo de império de que falamos. Falamos de um império político, com fronteiras? A História mostra que todos os impérios políticos degeneraram em despotismos. Não encontram nenhum caso excepcional. Falamos de um império económico? Está claro que o comércio internacional não tem as mesmas preocupações morais que tem o comércio a nível interno. É de um pretenso império cultural que falamos? Seja. É uma imagem simpática, poética, mas que nas relações económicas e políticas significa pouco ou nada. Só quem se quer enganar a si próprio, ou quem quer enganar outros, é que ainda acredita que os brasileiros e o Brasil precisam dos portugueses e de Portugal para negociar com os europeus e com a Europa. Se os países de Língua Portuguesa formassem uma associação (ou comunidade) forte, ao nível da Commonwealth, a história seria ligeiramente diferente. Mas não é isso que temos. Concluindo este primeiro ponto - História dos impérios: "lição obrigatória ao futuro descrente e decadente"? Concerteza. Para que não repitamos os erros do passado e evitarmos discursos imperialistas, sejam esses discursos de carácter comunista, capitalista, ou até tradicionalista.
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2. O dever. O meu único dever é para com a verdade. Considero que a análise dos assuntos exige do homem sábio um espírito aberto e que siga a verdade para onde quer que ela vá, embora através de meios que estejam de acordo com a moral. Um juiz não pode ser cego, nem surdo: ouve todas as hipóteses com espírito aberto à verdade, e só no fim decide. Não sou sábio, nem sequer sou juiz. Mas tento buscar a verdade com a mesma abertura de espírito e prudência com que o sábio e o juiz a buscam. É nesse processo que se distingue melhor quem é o inimigo - se é que há inimigo - e quais são os aliados. Não considero os Estados Unidos um nosso inimigo, nem penso isso da Europa Continental. Acho que estão ambos do mesmo lado e formam juntos uma civilização - a Civilização Ocidental (extensível ao Canadá e à Austrália).
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3. O anti-americanismo. Tenho para mim que os Estados Unidos nunca quiseram ser a principal potência mundial. Foram-no por acidente. Aliás, toda a História dos Estados Unidos está repleta de grandes conquistas involuntárias. Os americanos eram patriotas e não se quiseram tornar independentes: foram forçados a isso. Os EUA são o fruto de más políticas fiscais e coloniais. No taxation without representation. Mas também são fruto de liberdades pensadas e adquiridas desde que são Nação. Cresceram, em alguns momentos por acaso: como comprova a compra a preços de saldo da Louisiana aos franceses e do Alasca aos russos. Os Estados Unidos, na sua base, sempre se preocuparam muito mais em desenvolver-se internamente e fazer comércio pacífico a nível externo. Foram obrigados a intervir na I Guerra Mundial na Europa, a pedido de vários países. A Europa não aguentou a humilhação de reconhecer que já não era capaz de resolver uma guerra sozinha. Na II Guerra Mundial, uma vez mais os EUA só entraram quando a tal foram obrigados. Mais uma vez, a guerra na Europa só se resolveu graças aos EUA, que ainda por cima ajudaram os países europeus na sua recuperação. Dupla humilhação. E, como se não bastasse, formaram-se dois grandes blocos: os aliados da URSS e os aliados dos EUA. A Europa, uma vez mais, precisou de recorrer à sua antiga colónia, aliando-se aos EUA. Paradoxal, não? Depois da queda do Muro de Berlim e do desmembramento da URSS, ficou muito mais confortável à Europa Continental armar-se em anti-americana. A Europa Continental é orgulhosa e não aguenta ter sido ajudada pelos EUA nas guerras e nos pós-guerra's. Não sabe reconhecer que foi salva pelos Estados Unidos. O anti-americanismo que cá se vive é não só profundamente injusto, como também uma traiçoeira expressão de má educação - somos mal agradecidos. Perante os novos perigos que se avizinham, a quem iremos recorrer? Não ser anti-americano não quer dizer que nos tornemos lacaios dos EUA. Mas é reconhecer o seu valor histórico e moral na reconstrução da Europa. Ser-se anti-americano é querer dividir o Mundo Ocidental, perante novos Mundos emergentes, como o Indiano e o Chinês.
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4. Os continentais. O TAM diz-se Continental, com C grande e pundonor. Mas resta saber de onde vem esse orgulho. De Rousseau e a sua vontade geral? Da Alemanha Nazi? Da França de Vichy? Da Itália de Mussolini? De Marx? De Hegel? De Lutero e Calvino? Do modernismo? Da liberdade contra a qual se atenta, da igualdade invejosa de diferenças e da fraternidade fraticida, apregoadas na Revolução Francesa? Voltemos à II Guerra Mundial, para ver como se portou a grande Europa Continental. A Inglaterra foi a única potência que se opôs à Alemanha durante toda a II Guerra Mundial. França, Espanha, Itália e outras nações continentais foram colaboracionistas nazis. Apenas Inglaterra aguentou firme nos seus ideais. E uma vez mais, a vitória não era possível sem a ajuda dos EUA. É esta a Europa Continental de que nos orgulhamos? Perdoem-me, mas recuso-me fazer parte desse grupo. Portugal na sua História foi mais sábio, e soube cultivar a mais antiga aliança do Mundo - com Inglaterra.
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5. Os impérios de influência. É claro que há impérios de influência. De todos os lados eles aparecem, e são vários. Recordo-me por exemplo de uma situação: uma aluna portuguesa foi fazer o seu PhD a Harvard. Ao voltar a Portugal, fez um pedido de equivalência para Doutoramento na Universidade Clássica de Lisboa. A universidade de cá recusou, dizendo que o PhD de Harvard corresponde a um mestrado de cá. Harvard respondeu a perguntar quantos prémios Nobel já sairam da Clássica. Sabemos o prestígio de Harvard, recorrentemente apontada como a melhor e mais completa universidade do Mundo. Este gesto da Clássica é ou não produto de uma influência anti-americana injusta? Vamos lá ser sérios. No que diz respeito a instituições de ensino, onde estarão as mais conceituadas (em todas as áreas): na Europa Continental, ou nos EUA e Inglaterra? Não é preciso uma grande tese de doutoramento da Clássica para responder a esta pergunta. Num plano mais político, vejamos só a forma como José Maria Aznar e o PP espanhol foram castigados por ir contra a influência anti-americana vigente: bombas, mortos, mentiras, manipulação dos media, tudo serviu para os afastar.
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6. Saudosismos. Na política, há pouco espaço para a saudade. A saudade deve-se viver no íntimo de cada pessoa, pois sempre que se tornou desígnio imperial deu grandes complicações. Ilustro esta afirmação com os primeiros três exemplos que me ocorrem: a) Hitler e a resposta ao Tratado de Versalhes, que humilhara uma Alemanha grandiosa. O resto da história já conhecemos, deu no que deu. b) Napoleão e a tentativa de recuperar França como um império. Conseguiu, mas durou pouco e o preço a pagar por isso foram todas as vidas que se perderam e o atraso económico que se sempre acontece após a guerra. c) Alexandre Magno, o Macedónio que quis dar à Grécia Antiga uma grandiosidade espacial que acompanhasse a grandiosidade espiritual, política e científica que a Grécia já tinha. O império construiu-se em poucos anos e, com a morte de Alexandre, destruiu-se em poucos anos. Muitos mais exemplos existem. O exemplo que nos é mais familiar é a teimosa insistência portuguesa na guerra colonial, a partir de certo momento.
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Quanto a mim? Português, Crente, mas Realista e pouco utópico.
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AVC

3 comentários:

Anónimo disse...

Epá, sempre polémico este Tom Cruise! Mas olha que vale a pena ler os teus pontos de vista. Tá? Kisses

Tiago disse...

Anti-americanismo é o mesmo que pró-Nacional? Se não for, sigo a segunda opção. Abraço e mantenhamos a abertura de diálogo que o Estado Novo raramente, com efectividade, conseguiu ter.
TAM

Anónimo disse...

onde se lê "deve-se viver", leia-se "deve ser vivida"